Agustín Sánches
Lavega
“A humanidade investe muito mais
em comida para cães do que em investigação
espacial.”
Em que consiste o seu trabalho na Vénus
Express?
O nosso grupo tem estado há muito tempo a trabalhar
na investigação das atmosferas planetárias.
A de Vénus, sendo muito densa, apresenta características
muito particulares e decidimos analisá-la em profundidade.
A Vénus Express dispõe de uma câmara,
chamada Virtis, que capta imagens de alta resolução
mediante um sistema espectral. Graças a este instrumento
podemos estudar, tanto a dinâmica atmosférica,
isto é, tentar medir os ventos e as características
das nuvens, como o fenómeno da super-rotação
de Vénus, porque ainda que o planeta gire lentamente,
a sua atmosfera roda a grande velocidade.
Que podemos aprender com estes estudos?
Poderemos saber porquê Vénus, um planeta com
uma massa e tamanho similares aos da Terra, é totalmente
diferente em relação à sua atmosfera
e evolução. Para além disso, sabemos
que ao estudar a meteorologia de outros planetas poderemos
compreender melhor os fenómenos meteorológicos
do nosso próprio planeta. Actualmente, fazer previsões
meteorológicas para além de uma semana é
muito complicado e por isso os modelos que se utilizam hoje
têm muitas limitações. Vamos tentar aplicar
o modelo de previsão terrestre em Vénus e isso
vai ajudar-nos a aperfeiçoá-lo. Basicamente,
o que fazemos é tentar utilizar as atmosferas de outros
planetas como laboratórios naturais para estudar a
meteorologia terrestre.
Quais são as principais diferenças
entre Vénus e a Terra?
Não se sabe exactamente o motivo mas Vénus evoluiu
de forma totalmente diferente à da Terra, apesar dos
dois serem planetas de características físicas
similares. A grande diferença é que o nosso
planeta tem uma atmosfera basicamente de oxigénio,
produzida pela actividade biológica; enquanto que Vénus
tem uma atmosfera de hidróxido de carbono que produz
um efeito estufa exagerado com temperaturas à volta
dos 450 graus na superfície e pressões como
as que sofre a Terra a mil metros de profundidade nos oceanos.
As nuvens venusianas são também totalmente diferentes
das terrestres, já que são compostas de ácido
sulfúrico concentrado. Para além disso, a sua
atmosfera demora apenas quatro dias a dar a volta ao planeta,
enquanto este demora 243 dias a dar uma volta sobre si próprio.
A origem destas diferenças é o que a Vénus
Express vai tentar perceber.
Existe alguma possibilidade de existir
vida em Vénus?
A verdade é que o mais provável é que
nunca tenha existido vida em Vénus. A única
zona onde há uma possibilidade remota de que exista
algum micro organismo seria na alta atmosfera, naquelas capas
próximas das nuvens, onde a temperatura e a pressão
estão mais perto das da Terra. Mas é certo que
devemos tentar encontrar algo, já que considero que
não devemos fechar os olhos ante a procura do mais
imprevisível, ainda que seja mais provável encontrar
vida em Marte do que em Vénus.
O que diria aos que pensam que se investe
demasiado dinheiro na investigação espacial
quando há outros problemas na Terra?
Há que analisar bem em que se gasta o dinheiro já
que, por exemplo, a humanidade investe muito mais em comida
para cães do que em investigação espacial.
Devemos esclarecer que recebemos muitas coisas do espaço.
As pessoas não sabem que a maioria dos avanços
tecnológicos que se aplicam na vida quotidiana provêm
de estudos desenvolvidos fora da Terra. Além disso,
oferece conhecimento sobre a origem da humanidade, analisando
os motivos pelos quais podemos esquecer que no futuro o homem
ver-se-á obrigado a abandonar o nosso planeta devido
aos recursos limitados. Hoje pode parecer ficção
científica mas é certo que o homem irá
encontrar recursos no espaço no futuro. Um último
aspecto concreto é que a Agencia Espacial Europeia
fomenta fortemente a colaboração entre países,
rompe barreiras e ajuda à consolidação
de um projecto europeu comum. É evidente que o espaço
nos une.
entrevista de Jordi Bascuñana |