Maria Margarida Souto-Carneiro
“Ainda estraguei algumas bonecas
à conta de operações cirúrgicas.”
Qual o papel do Instituto Gulbenkian
de Ciência na concretização da sua investigação?
Desde o meu retorno a Portugal, que o Instituto Gulbenkian
de Ciência (IGC) tem tido um papel primordial na execução
do meu projecto de investigação em artrite reumatóide.
A filosofia do IGC de promoção da independência
científica dos seus investigadores doutorados, aliada
aos excelentes meios técnicos científicos (equipamento
de tecnologia de ponta, biotério e produção
de animais transgénicos, vasta biblioteca científica)
e presença de alguns dos melhores grupos de investigação
portugueses, têm permitido executar e discutir todas
as fases do meu projecto.
Estimula-a pensar nos beneficiários das suas
descobertas, ou a sua motivação é essencialmente
académica?
A minha principal motivação são os potenciais
beneficiários dos resultados que forem alcançando
nos meus estudos em artrite reumatóide. Embora, por
vezes, seja aliciante dedicar-me a um tema por razões
meramente académicas, penso que não posso perder
de vista a necessidade de produzir resultados que possam ter
uma aplicação prática. Aliás,
a gravidade da doença e os efeitos devastadores económicos,
sociais e psicológicos da artrite reumatóide,
tornam imperiosa a necessidade de descobrir novas formas de
prevenção, terapia e compreensão desta
doença. Também o facto de estar a receber verbas
estatais, obriga-me moralmente a tentar "devolver"
aos cidadãos o investimento que estão a fazer.
Considera as cobaias danos colaterais?
Não considero que as cobaias sejam danos. As cobaias
são essenciais para o avanço científico,
e sem a sua utilização estaríamos ainda
a anos-luz do conhecimento actual. Porém, o facto de
serem seres vivos obriga-nos a respeitá-las e ponderar
e avaliar ao pormenor cada experiência que envolva a
sua utilização.
Quando criança brincava aos médicos?
Sim... ao ponto dos meus irmãos já não
me poderem ouvir! Ainda estraguei algumas bonecas à
conta de “operações cirúrgicas”.
Acredita que diferenças hormonais entre o homem
e a mulher justifiquem a sua maior ou menor aptidão
para a investigação científica?
De maneira nenhuma. Existem cientistas mais ou menos aptos
de ambos os sexos. Tudo tem a ver com a motivação
própria de cada pessoa. Às vezes poderá
parecer que as mulheres na ciência não são
tão aptas quanto os homens, mas isso não se
prende com as diferenças hormonais, mas com os papéis
sócio-culturais que são exigidos a cada um.
Se as hormonas dos homens também lhes permitissem ter
filhos, então facilmente haveria igual número
de homens e mulheres nas posições cimeiras da
ciência (e não só), uma vez que não
seriam só as mulheres a verem as suas carreiras interrompidas
para se dedicarem mais à família. Felizmente,
a possibilidade de as mulheres terem filhos cada vez mais
tarde está a permitir que elas possam evoluir profissionalmente
a par dos homens.
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