Tito Trindade
“Nanotecnologia implica mais pequeno
e melhor desempenho.”
A tecnologia por si implementada é
visível?
Na última década tenho realizado investigação
na área das nanociências com especial incidência
na síntese química e caracterização
de nanoestruturas. Mais recentemente estas actividades de
investigação têm sido dirigidas no sentido
de desenvolver nanoestruturas que possam ser aplicadas como
novos materiais funcionais. Tendo presente a internacionalização
da investigação científica, em particular
na área das nanotecnologias, considero que estes procedimentos
são uma contribuição válida, embora
modesta, para uma tecnologia que gradualmente se vai tornando
mais visível aos olhos do cidadão. Refiro-me
concretamente ao aparecimento de produtos de base nanotecnológica,
desenvolvidos a partir da investigação realizada
por uma numerosa comunidade científica, à qual
tenho orgulho em pertencer.
Como se manipulam as nanoestruturas?
As nanoestruturas que tenho investigado mais intensamente
são partículas com dimensões tipicamente
entre 1-100 nm, daí a designação de nanopartículas.
Estas podem ser manipuladas individualmente recorrendo a métodos
físicos, como por exemplo microscópios de sonda
que permitem explorar o mundo à escala molecular. No
entanto, existe um objectivo bem mais ambicioso que consiste
na manipulação por via química de sistemas
macroscópicos constituídos por milhares e milhares
de nanopartículas. Para atingir este objectivo, investigam-se
em vários laboratórios do mundo, estratégias
baseadas em processos de auto-montagem (self-assembly) de
nano-objectos. O termo LEGO-Química tem sido muito
utilizado neste contexto, no sentido de estabelecer uma analogia
entre a nanoquímica e a manipulação de
blocos LEGO. Estes apresentam determinadas características
que os tornam indicados para construções específicas.
No caso dos nano-objectos, pretende-se conferir determinadas
funções químicas que permitam processos
de reconhecimento químico e auto-organização
em estruturas hierarquicamente mais complexas. A Natureza
utiliza procedimentos análogos de tal modo eficientes
que permitem que haja vida!
Qual a aplicação prática
da computação quântica na nanotecnologia?
A computação quântica irá ter um
impacto muito grande na sociedade em geral e não apenas
ao nível da nanotecnologia. Não sendo um especialista
neste domínio, limito-me a antecipar uma forma inovadora
de lidar com informação, com ferramentas muito
mais poderosas do que as actuais e cujas potencialidades não
deixarão de nos surpreender.
Que especialidades podem tirar partido
da nanotecnologia?
Nas nanotecnologias e nanociências confluem conhecimentos
de diversas especialidades científicas. É uma
área naturalmente multi-disciplinar e operacionalmente
inter-disciplinar. Dificilmente se desenvolvem produtos de
base nanotecnológica, internacionalmente competitivos,
ignorando o cruzamento de diferentes especialidades científicas.
Nanotecnologia implica mais pequeno e melhor desempenho, pelo
que são vários os campos de actividade humana
nos quais a nanotecnologia está a ter uma contribuição
marcante. Para além da computação, referida
anteriormente, saliento as aplicações em medicina,
preservação do ambiente, sustentabilidade energética
e, obviamente, na opto-electrónica em geral. Mas também
áreas tradicionais, como por exemplo os têxteis,
o papel, a cerâmica e as tintas, podem aproveitar a
revolução nanotecnológica no sentido
de fabricar produtos inovadores que incorporem nanomateriais.
A esta escala, qual a diferença
entre nanoquímica e nanofísica?
As complementaridades são seguramente mais importantes
do que as diferenças entre ciências irmãs,
neste caso a Química e a Física. Por vezes a
separação entre disciplinas científicas
surge por limitação humana e não tanto
pelo conhecimento científico propriamente dito, dado
que a verdade científica será a mesma independentemente
da perspectiva de análise. Mas sem querer fugir à
questão, a Nanoquímica distingue-se da Física
de sistemas de baixa dimensionalidade sobretudo na compreensão
das propriedades químicas e de reactividade de nanoestruturas.
A Nanoquímica investiga a síntese de nanoestruturas
no sentido de desenvolver novos materiais, recorrendo a métodos
tipicamente químicos, frequentemente designados por
métodos bottom-up. Ao nível da preparação
de materiais, os métodos físicos são
normalmente designados por top-down. Nas minhas aulas,
costumo distinguir estas duas abordagens na preparação
de nanomateriais recorrendo a uma analogia, para a qual me
socorro de um postal do Egipto que ilustra a Esfinge (construção
top-down) como a guardiã das pirâmides
de Gisé (construções bottom-up).
Na Esfinge, o detalhe foi obtido esculpindo uma rocha gigantesca,
enquanto as grandes pirâmides foram construídas
bloco a bloco... O conjunto evoca a capacidade de realização
humana e os seus mistérios. Era assim na Antiguidade
e continua a sê-lo ainda hoje, na era da Nanotecnologia!
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