Teresa Cerveira Borges
“Deveríamos repensar seriamente
na utilização de certas artes de pesca.”
Como tem evoluído a arte de
pesca ao longo dos tempos?
Artes de pesca há muitas, com formas e materiais muito
variados, podendo estas ser mais ou menos específicas.
Na generalidade, as artes de pesca têm evoluído
ao longo dos tempos, evolução essa dependente
do tipo de arte de pesca. Se pensarmos que a primeira arte
de pesca poderá ter sido a nossa mão, vemos
que evoluíram bastante, principalmente devido ao facto
de ao longo dos tempos termos aprendido mais e mais sobre
o comportamento dos animais aquáticos, conhecimento
esse que levou a um melhoramento das artes de pesca.
Como se podem classificar as artes
de pesca?
Várias são as classificações das
artes de pesca que podem ser mais ou menos complexas. No entanto,
há uma classificação muito utilizada
pela sua simplicidade e exactidão. Essa classificação
é a separação das artes de pesca em “artes
passivas” – o peixe tem que se dirigir à
arte; e “artes activas” – a arte vai ao
peixe. Exemplo de artes passivas, são as armadilhas,
redes de emalhar, linha e anzol; de artes activas, o arrasto
de fundo. Esta classificação nada tem a ver
com “movimento”! O uso da linha e anzol num barco
em movimento (“pesca ao corrico”) continua a ser
uma arte de pesca passiva, pois é o peixe que tem de
se dirigir à arte de pesca, neste caso linha e anzol.
Se 70 por cento das espécies
capturadas não servem para consumo, como se poderia
reduzir esta percentagem?
Muito se tem feito para diminuir a chamada “captura
acessória”, razão da grande percentagem
de rejeição nas pescas. A nível técnico,
o uso de dispositivos para redução dessas capturas
(BRDs – By-catch Reducing Devices), como os paneis de
malha quadrada e as grelhas, têm sido adoptados por
vários países com bastante sucesso pelos pescadores.
Estudos realizados em Portugal pelo IPIMAR demonstraram resultados
encorajadores quanto à exclusão de espécies
não comerciais capturadas em grande quantidade. No
entanto, há ainda bastante a fazer para ultrapassar
a preocupação e desconfiança dos pescadores.
Há, no entanto, necessidade de nos consciencializarmos
que para além de melhorar a selectividade das artes
de pesca deveríamos repensar seriamente na utilização
de certas artes de pesca. É o caso do arrasto de fundo
que por mais que se diga que a rede é selectiva, não
deixa de trazer muito do que lhe “aparece à frente”,
enfiando tudo dentro dum “saco” numa amálgama
que, por vezes, até as próprias espécies
comerciais não podem ser aproveitadas por estarem tão
danificadas. É preciso lembrar que um arrastão
lança a sua rede de pesca para o fundo onde fica a
arrastar entre 2 a 12 horas, conforme o tipo de arrastão
(arrastão de peixe ou arrastão de crustáceos,
respectivamente). Imaginem como ficam os primeiros peixes
a serem capturados! Claro que a substituição
(ou mesmo desaparecimento, como por vezes se fala) do arrasto
tem consequências socioeconómicas que não
podemos ignorar, e por isso, não pode ser feito “sobre
o joelho”.
Qual a importância das espécies
de peixe não comerciais no ecossistema marinho?
Atenção, quando falamos de espécies falamos
de todos os grupos de animais marinhos. Não só
de peixes! Na realidade a importância das espécies
não comerciais varia, mas na sua generalidade todas
têm uma posição mais ou menos importante
num determinado nível da cadeira trófica de
uma ou várias outras espécies. A abundância
de certas espécies comerciais pode estar a diminuir
devido a outras espécies importantes para a sua alimentação
estarem a desaparecer. Para além disso, não
podemos esquecer a importância da preservação
da biodiversidade. Que isto não seja uma frase feita
e fútil, mas sim um acto real e de consciência.
Quais os objectivos do programa “Ciência,
Educação e Arqueologia Marinha: À Descoberta
do Fundo do Mar”?
O programa Luso-Americano SEMAPP (Science, Education and Marine
Archaeology Program for Portugal) tem como objectivos principais
não só a investigação marinha
nas áreas da biologia e arqueologia, como na difusão
do interesse pela investigação científica
nas camadas mais jovens (estudantes de vários níveis
do ensino – secundário e universitário)
através da preocupação constante na participação
desses jovens nas campanhas de mar. Apesar das suas diferenças,
estes grupos de investigação têm a oportunidade
de utilizar equipamentos que por si sós provavelmente
não conseguiriam, devido a questões financeiras
(problema cada vez maior nos nossos dias). Na área
da biologia o objectivo principal é um maior conhecimento
dos nossos fundos, desde a biodiversidade a aspectos da ecologia
e comportamento das espécies.
Que vantagens para a investigação
tem trazido o recurso ao mini-submarino Delta?
Como deve calcular é muito dispendioso o recurso a
este tipo de equipamento e, por isso, tínhamos objectivos
muito concretos (mais focados para a biologia) para a campanha
SEMAPP de 2004, em que utilizámos o “Delta”,
objectivos esses atingidos. Este tipo de equipamento (mini-submarinos
e submersíveis, como os ROVs) têm a grande vantagem
de nos possibilitar observar directamente e ao vivo, locais
que dificilmente lá se pode chegar. Aquilo que observámos
foi extremamente enriquecedor e provavelmente levaríamos
muito mais tempo a analisar e concluir sem o “Delta”.
Até mesmo para o público em geral, particularmente
para os pescadores, foi-nos possível mostrar imagens
da pobreza dos nossos fundos. É verdade já todos
sabemos que os nossos fundos do mar estão pobres, mas
ver é sem dúvida outra coisa!
Qual o impacto da pesca do arrasto
nas espécies marinhas?
Uma palavra: ARRASADOR. |