Que problemas levanta
o contacto do sangue com dispositivos médicos?
Quando um dispositivo médico (biomaterial) contacta
com o sangue, o primeiro evento que ocorre é
a adsorção de proteínas do sangue
à superfície do material. Dependendo do
tipo de proteínas que adsorve, pode ou não
haver posterior activação, adesão
e agregação das plaquetas do sangue e
formação de um coágulo. A existência
de coágulos poderá impedir o dispositivo
médico de cumprir a sua função
correctamente.
Como pode ser produzido um biomaterial que
evite a coagulação do sangue?
No Instituto de Engenharia Biomédica –
INEB uma das estratégias que estamos a utilizar
é tornar a superfície dos dispositivos
médicos selectiva para uma proteína do
sangue, a albumina. Para isso estamos a revestir a superfície
dos biomateriais com ligandos específicos para
albumina que vão “atrair” esta proteína
da corrente sanguínea.
Qual a acção da albumina?
A albumina tem um efeito “passivante”, ou
seja, não activa nem adere às plaquetas
do sangue. Se a albumina estiver na superfície
do biomaterial, outras proteínas que activam
as plaquetas, como por exemplo o fibrinogénio,
não se vão ligar à superfície
e por isso vai haver uma diminuição da
formação de coágulos.
O que são monocamadas auto-estruturadas?
As monocamadas auto-estruturadas são superfícies
modelo que utilizamos para estudar a interacção
da superfície com as proteínas à
escala molecular. A sua preparação consiste
em revestir uma placa de ouro com uma única camada
de compostos com determinados grupos que queremos expor
na superfície. Uma vez que são superfícies
extremamente organizadas e homogéneas, é
mais simples estudar a interacção entre
o ligando que imobilizamos e as proteínas do
sangue. O objectivo é determinar nestas monocamadas
auto-estruturadas qual a concentração
ideal de ligandos necessária para ligar a albumina
de uma forma selectiva e reversível. Numa fase
posterior é então possível usar
o conhecimento adquirido com as superfícies modelo
para fazer o mesmo em polímeros que poderão
ser utilizados na produção de dispositivos
médicos para contacto com o sangue.
Aonde entra a nanotecnologia no seu trabalho?
Para além das monocamadas auto-estruturadas formadas
na superfície da placa de ouro terem uma espessura
da ordem dos 2 nm, a interface entre estas superfícies,
os ligandos e as proteínas ocorre à escala
molecular. Para conseguir detectar moléculas
tão pequenas é necessário recorrer
a equipamentos e tecnologias que nos permitem operar
ao nível dos nanómetros (a bilionésima
parte do metro) ou mesmo dos angstroms (aproximadamente
o diâmetro de um átomo).
Biografia
Investigadora do Instituto de Engenharia Biomédica
(INEB), está a desenvolver a sua tese de doutoramento
na construção de superfícies nanoestruturadas
para adsorção selectiva e reversível
de albumina, de forma a reduzir o risco de formação
de coágulos em biomateriais para contacto com
sangue.
Publicou na revista Biomaterials, juntamente com Cristina
Martins e Mário Barbosa, do INEB, e Buddy Ratner,
da Universidade de Washington, um artigo que lhe valeu
o prémio Pulido Valente Ciência 2006. Trata-se
de um prémio que pretende distinguir o melhor
trabalho de investigação publicado por
um investigador com idade igual ou inferior a 35 anos
na área da Física e Engenharia - Aplicações
ao Estudo da Doença e Prática Médica.
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