O que é
a análise química espectral?
A técnica que usamos é mais precisamente
análise espectral óptica e de uma forma
sucinta baseia-se no facto de diferentes compostos químicos
absorverem de forma diferenciada os comprimentos de
onda da luz. Cada comprimento de onda vai corresponde
a uma cor, podendo estas cores ir desde os ultravioletas
até ao infravermelho. Por exemplo, quando olha
para uma parede pintada de vermelho, o que acontece
é que o pigmento da tinta está a absorver
todas as cores visíveis excepto o vermelho, que
acaba por ser reflectido. Se medirmos a reflectividade
com equipamento adequado (espectrómetro) podemos
saber muito sobre a composição química
desse pigmento.
Como é que o Forest Fire Finder (F3)
distingue o fumo de uma nuvem?
O F3 usa espectroscopia óptica. Como a composição
química do fumo é diferente da de uma
nuvem, que é só água, o que vai
acontecer é que os comprimentos de onda absorvidos
pelo fumo vão ser distintos dos absorvidos pela
nuvem, conseguindo assim fazer-se a distinção.
Estando o país apenas parcialmente coberto
pelas redes telefónicas móveis, como pensa
solucionar a transmissão de dados do F3 para
a estrutura nacional?
O F3 foi construído de forma a poder usar qualquer
tipo de comunicação que esteja disponível.
No limite, pode apenas limitar-se a enviar um SMS com
a direcção do incêndio. No território
nacional, usando antenas de alto ganho ou direccionais,
é possível enviar SMS praticamente em
qualquer lugar. No entanto, tentamos ter sempre transmissão
de dados com uma maior largura de banda pois isso permite,
por exemplo, também transmitir imagens dos incêndios,
o que pode ser útil para o planeamento do combate
ao evento. Para solucionar isso a solução
por nós preferida é existir um feixe de
dados a interligar as diferentes torres, estando apenas
algumas delas ligadas, por exemplo, à internet.
Caso nenhuma solução tradicional seja
possível podem sempre usar-se comunicações
por satélite, que neste momento já são
economicamente competitivas para a quantidade de dados
que necessitamos de transmitir.
Como é que um engenheiro biomédico
se envolve com as tecnologias de detecção
de incêndios?
No fundo, a tecnologia que está a ser usada para
a detecção de incêndios é
muito semelhante à tecnologia que uso nos projectos
na área da oftalmologia. A diferença de
se estar a observar os espectros do fundo do olho (retina)
ou a fazer detecções de incêndios
por espectroscopia, é que no segundo caso o telescópio
tem de ser muito mais poderoso e o varrimento (taxa
a que se repetem as medidas) é muito mais lento.
Obviamente que a forma como se interpretam os dados
é um pouco diferente; enquanto na oftalmologia
se está a tentar observar alterações
bioquímicas da retina de forma a diagnosticar
eventuais doenças, no caso da detecção
de incêndios verificam-se as alterações
bioquímicas da atmosfera.
Que sugestões propõe para uma
mais estreita ligação entre a Universidade
e a indústria?
Esta é uma pergunta complicada. No fundo, acho
que o problema é muito cultural; nem as universidades
estão habituadas a colaborar com a indústria
nem a indústria encontra necessidade de colaborar
com as universidades. Falando apenas na colaboração
com as faculdades de engenharia e ciências, na
minha opinião essa colaboração
é mais eficiente quando existem componentes de
desenvolvimento tecnológico e/ou cientifico envolvidas.
Isso implica que exista uma indústria que encontre
uma necessidade real nesse desenvolvimento e uma universidade
com a flexibilidade suficiente para se adaptar e responder
a essas necessidades. Neste momento nota-se uma maior
dinamização dessas colaborações
mas ainda existe um longo percurso a percorrer se queremos
ficar competitivos. Também acho que as ‘startups’
que são criadas nas próprias universidades
podem vir a dinamizar este relacionamento, mas estamos
a falar de algo em que ainda existe pouca experiência
e em que os casos de sucesso, embora existam e sejam
significativos, ainda são muito pontuais.
Biografia
Autor do sistema Forest Fire Finder (F3), que utiliza
uma tecnologia já antiga (análise química
espectral) para a detecção precoce de
incêndios florestais.
Doutor pelo Departamento de Física Biomédica
e Bio-Engenharia da Universidade de Aberdeen, UK.
Mestre pelo Instituto de Biofísica e Engenharia
Biomédica (IBEB) da Universidade de Lisboa.
Licenciatura em Física Tecnológica pela
Universidade de Lisboa.
Áreas de investigação:
Espectroscopia de fluorescência resolvida no tempo
aplicada ao diagnóstico médico.
Detecção automática de drusas em
imagens de retinografia.
Detecção automática de incêndios
florestais por espectroscopia óptica.
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